Especialista em narrativa transmídia, Henry Jenkins fala sobre o futuro de Hollywood

Masterclass do autor de ‘Cultura da Convergência’ será dia 9/12, no Workshop Internacional de Séries, que tem apoio da Casa Firjan

03/12/2020

Especialista em narrativa transmídia, Henry Jenkins fala sobre o futuro de Hollywood  Especialista em narrativa transmídia, Henry Jenkins fala sobre o futuro de Hollywood

Autor de um livro visionário e seminal de 2006 (o lançamento no Brasil foi em 2008), Henry Jenkins, reitor da Universidade do Sul da Califórnia, diz que usa cada vez menos a expressão título da obra, Cultura da Convergência. “A lógica que meu livro uma vez descreveu se tornou algo natural no panorama da mídia contemporânea”, explica ele, um dos pioneiros a estudar a relação entre comportamento e influência dos fãs e as transformações da mídia, cada vez mais interativa. Um dos pesquisadores mais respeitados do mundo sobre cultura digital, Jenkins é um dos convidados do Workshop Internacional de Séries, realizado pela Autoria, em parceria com a Escola de Séries e apoio da Casa Firjan, de 7 a 11 de dezembro. Com o título “Do MIT para o Futuro de Hollywood”, a masterclass dele será na quarta-feira, 9/12, às 19h.  “O envolvimento dos fãs se tornou central para a forma como as indústrias de mídia funcionam hoje”, resume o professor.

Leia a entrevista abaixo.







Henry Jenkins | Divulgação
Henry Jenkins | Divulgação

Sua masterclass será sobre transmídia e cultura de fãs. Poderia adiantar alguns pontos que pretende abordar? 

A masterclass tem como objetivo fornecer uma visão ampla das maneiras como o envolvimento dos fãs se tornou central para a forma como as indústrias de mídia funcionam hoje. O movimento em direção à construção de um mundo transmídia foi concebido como uma estratégia para apoiar uma diversidade de comunidades de fãs ao redor do mundo, dando-lhes recursos para construir suas próprias produções culturais. Vou discutir essas práticas em relação aos mercados globais de mídia, novos movimentos em Hollywood em direção à diversidade e inclusão, e formas contemporâneas de ativismo jovem. 



Você esteve no Brasil pela última vez em 2011 e, em uma entrevista publicada no jornal Folha de S. Paulo, disse que o cenário da época sugeria que o Brasil estava prestes a se tornar uma superpotência da mídia e da cultura pop. Pelo que acompanha do país, esse cenário se materializou?  

Como não estou no Brasil há quase uma década, não estou em posição de oferecer uma análise sofisticada de todas as razões pelas quais o impacto do Brasil até agora foi menor do que eu e outros poderíamos esperar e imaginar. Estamos vendo conteúdo brasileiro na Netflix ao redor do mundo, por exemplo. Mas suspeito que aquela possibilidade que estávamos vendo naquele momento se perdeu devido ao aumento da instabilidade política dentro do país e ao aumento do nacionalismo e da política reacionária em todo o mundo.  



O que significa storytelling transmídia e qual a sua importância atualmente? Como essa estratégia foi impulsionada pelas mídias sociais? 

O storytelling transmídia se refere a um conjunto de práticas que distribui os elementos-chave de uma narrativa em vários sistemas ou plataformas para criar uma experiência de mídia mais rica e intensificar a experiência do público. Podemos olhar, por exemplo, Star Wars ou o Universo Marvel como exemplos práticos de narrativas transmídia convencional. A distribuição das informações é central porque cria oportunidades para que os fãs atuem como “caçadores e coletores”, fazendo suas próprias descobertas e compartilhando-as em suas redes sociais, mantendo a comunidade discutindo ativamente a história entre vários segmentos. Cada vez mais essas histórias são organizadas em torno de práticas de criação de mundos de modo que, como no exemplo da Marvel, um universo compartilhado permite que os criadores de mídia contem várias histórias envolvendo vários personagens em várias plataformas dentro do mesmo mundo. 



O que é Cultura de Convergência? 

Essa é uma palavra que uso cada vez menos, à medida que a lógica que meu livro uma vez descreveu se tornou algo natural no panorama da mídia contemporânea. As premissas básicas eram: conforme a propriedade da mídia se torna mais concentrada, conforme as tecnologias de mídia possibilitam que a mídia flua facilmente entre as plataformas, conforme o público se torna mais hábil em se apropriar, remixar e recircular o conteúdo da mídia por meio das redes sociais, conforme a narrativa transmídia se torna mais difundida, esses fatores irão moldar cada vez mais a mídia que é produzida e como é consumida. As formas como os consumidores e produtores de mídia responderam na pandemia nos mostra a cultura de convergência em ação: como não seria mais possível contar com a distribuição e exibição de filmes em salas de cinema, o conteúdo de streaming se tornou mais central, com plataformas de nicho, como o Twitch, e games alcançando maior da atenção do público, e com fãs produzindo entretenimento uns para os outros. Também estamos vendo filmes de Hollywood experimentando diferentes formas de acesso via streaming, retrabalhando seus modelos de mídia para um mundo onde a exibição será fundamentalmente alterada em curto, médio e potencialmente longo prazo. Em suma, a cultura de convergência nos mostra como o pensamento atravessa toda a mídia e as mudanças em um setor têm impacto em todos os outros. 



Quais são as principais tendências da mídia e da comunicação para os próximos anos? 

Como sugere minha previsão sobre o futuro da mídia no Brasil em 2011, não tenho bola de cristal. Mas estou observando de perto: 



-- Novos padrões de troca de mídia em todo o mundo, acelerados pela Netflix, que está coproduzindo conteúdo em muitos dos principais centros de mídia e, portanto, embaralhando o fluxo de conteúdo de mídia. Também continuo muito interessado no que chamo de cosmopolitismo pop, que são fãs que buscam escapar do paroquialismo de seu próprio conteúdo nacional, moldando ativamente o fluxo da cultura pop de outros países. Hoje podemos pensar nisso em termos de fã-clube de K-Pop. 



-- As formas como o colapso, pelo menos agora, de filmes de Hollywood criará oportunidades para outras mídias - como Twitch - ganharem uma posição maior e outros produtores de mídia se tornarem mais competitivos, devido à redução dos padrões técnicos sendo normalizados 



-- A forma como o imaginário popular que informa o ativismo juvenil em todo o mundo foi moldada por vernáculos extraídos da cultura popular. Essas mudanças foram acompanhadas por novos modelos de mudança narrativa, que veem as intervenções na mídia como a melhor forma de gerar uma cultura mais democrática e pluralista. 



-- O aumento da pressão sobre as indústrias de mídia para serem mais inclusivas em suas práticas de representação e contratação.